Aquele que não conhece
Deus o Espírito,
não pode conhecer Deus de
modo algum.
THOMAS ARNOLD
OS POETAS nos dizem que, na primavera, as fantasias
de um jovem voltam-se para o amor. Na primavera de 1958, minha fantasia estava
trancada em um conflito mortal. Foi um conflito entre a minha humanidade mortal
e a lei imortal de Deus, uma batalha que não pode ser vencida, plena ou
finalmente, por nenhum ser humano.
Eu estava experimentando meu próprio "Meio-
Dia" particular. Se posso relembrar as palavras do tema da canção do
clássico do cinema que tinha Gary Cooper como astro, elas iam mais ou menos
assim:
Oh, estar dividido entre
o amor e o dever: supondo que eu perca minha amada de lindos cabelos.
Olhe para aquela grande mão movendo-se...
aproximando-se do meio-dia...
Minha amada não possuía tão belos cabelos, mas todo
o resto cabia dentro de minhas circunstâncias. Eu estava dividido entre o amor
e o dever, e o relógio já estava quase marcando o meio-dia.
Em 1952 me apaixonei. Na primavera de 1957 dei à
minha namorada um anel de diamante. Ficamos noivos e marcamos a data do
casamento. A cerimônia foi marcada para junho de 1960.
Mas todos os nossos sonhos e planos de casamento
foram abalados por uma inesperada onda de choque que nos atingiu no outono de
1957. Fui subitamente, violentamente (em um sentido espiritual) convertido a
Cristo. Corri para dar à minha noiva a alegre notícia. Eu quase nem podia
esperar para falar a ela da minha nova fé, na plena expectativa de que ela abraçaria o Senhor
imediatamente, comigo.
Derramei diante dela a história de minha conversão. Eu estava fervendo de
entusiasmo espiritual. Eu tinha encontrado a pérola de grande preço e estava
exaltando as maravilhas da opulência dessa pérola para ela.
Minha noiva não se mostrou nada impressionada. Era como tentar descrever um
caleidoscópio para um homem cego. Ela me ouviu polidamente, mas manteve uma
remota indiferença sobre o assunto. Ela se refugiu na esperança de que eu
estivesse experimentando uma "fase", estivesse flertando com alguma
espécie de loucura religiosa temporária.
"O que você quer dizer com isso de ter-se tornado um cristão?" ela perguntou.
"Você sempre foi um cristão. Você foi batizado, confirmado e tudo o
mais."
Ela tinha sido confirmada na mesma igreja em que eu fora confirmado.
Cantávamos juntos no coro da igreja. Íamos juntos à reunião dos jovens. Aprendemos a dançar juntos nos bailes sociais da igreja. E agora eu
estava falando em ter "nascido de novo". Essa era uma expressão que
ela nunca antes tinha ouvido. Isso aconteceu antes de Jimmy Carter, antes de
Chuck Colson, antes que a frase nascer de novo tivesse invadido o
dicionário da cultura popular americana. Em 1958, a frase transmitia à minha noiva um sinal de
fanatismo que representava uma clara e perigosa ameaça ao noss;o
relacionamento.
Conforme os meses foram passando, o que eu esperava que fomentasse o meu
relacionamento com minha noiva, em lugar disso causou uma severa tensão. Logo
descobri que não eram muitas as pessoas que compartilhavam de meu entusiasmo de ter nascido de novo. Minha mãe sentiu que
eu estava rejeitando a ela e aos seus valores. Minha irmã ficou hostil comigo.
Meus amigos estavam incrédulos. Meu pastor, dentre todas as pessoas, chamou-me
de "maldito imbecil".
Eu estava começando a aprender as tensões criadas
pelas diferenças de crença e de entendimento do cristianismo. Eu também estava
começando a aprender não somente os mandamentos de Moisés, mas também de Cristo.
Mas a pior regra de todas, a regra que me rasgava a alma, era aquela de estar preso por jugo desigual. Fui instruído que
um crente não tem permissão de casar-se com um incrédulo.
No entanto, eu estava apaixonado por uma moça
incrédula. Eu era noivo de uma jovem incrédula. Eu estava dividido entre o
amor e o dever.
Tentei barganhar com Deus. Fiz um voto diante dele.
Votei que se minha namorada não se tornasse crente até o final de uma visita
que ela faria ao meu colégio, eu terminaria o noivado.
Nada disse a ela sobre o meu voto. Também não falei
com ninguém a esse respeito. Era um pacto particular entre eu e o
Todo-poderoso.
Na manhã do dia em que ela tinha marcado que
chegaria, tranquei-me no meu quarto e iniciei uma vigília de oração
intercessória. Fiz os apelos da viúva importuna da parábola de Jesus, parecerem
suaves. Se houvesse um anjo presente para me enfrentar eu teria deixado no colchão
um paraplégico. Eu desconhecia inteiramente a questão da eleição e dos
decretos eternos. Se Deus não tinha o nome de minha noiva no Livro da Vida, eu
queria inscrevê-lo ali naquele mesmo dia. O violento estava conquistando à
força o reino de Deus. Ou, pelo menos, era o que eu estava tentando fazer.
Naquela noite ela foi comigo a uma reunião de oração. Ela estava relutante.
Estava desconfiada. Ela estava frustrada com a minha insistência para que ela
fosse comigo àquela "reunião religiosa".
No meio da reunião de oração, ela, tal como João Wesley, em Aldersgate,
sentiu o coração "estranhamente aquecido". E tal como Agostinho no
jardim e Martinho Lutero na torre, ela viu as portas do paraíso se escancararem,
e entrou por elas.
Terminada a reunião, com uma agitação que ultrapassava à minha, ela
proferiu estas palavras exatas: "Agora eu sei quem é o Espírito Santo".
Esse comentário não reflete a análise de um teólogo treinado. Foi a observação
de uma nova convertida à fé cristã. Penso, entretanto, que essas palavras
merecem alguma exposição. Foi a reação espontânea a uma experiência de transformação de
vida, e encerra o discernimento de uma reação virgem, de primeira olhadela, diante da fé.
Por mais simples que soe, essa declaração contém vários profundos
discernimentos. Portanto, vamos examiná-la de perto.
A palavra Agora é muito significativa. Agora refere-se ao tempo presente. As implicações claras são que o
agora faz um violento contraste com o que acontecia antes. O agora chama a atenção para algo
novo que não estava presente até ali.
Quando minha noiva fez essa afirmativa, ela explicou que no passado ela já
tinha ouvido falar no Espírito Santo. O Espírito Santo era mencionado na
igreja. A fórmula trinitariana: "Em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo" era ouvida com freqüência nas cerimônias de
casamento, nas palavras dos sacramentos do batismo e da ceia do Senhor, nas
bênçãos e nas palavras de encerramento da oração pastoral.
Não obstante, em sua experiência na igreja, as
palavras Espírito Santo, referiam-se simplesmente a uma porção vaga e abstrata da liturgia. O
nome ou título da Terceira Pessoa da Trindade não tinha qualquer significação
concreta para ela.
A palavra sei assinala o despertar de um reconhecimento. De súbito, um
reconhecimento abriu caminho, que estivera fechado pela abstração: "Agora eu sei".
Quando Vesta (minha noiva) adicionou as palavras eu sei, ela estava confessando um novo tipo de conhecimento.
Não tinha sido a primeira vez em que ela ouvira falar sobre o Espírito Santo.
Ela estava familiarizada com essa linguagem. Ela já havia estudado o catecismo. Ela possuía alguma
consciência cognitiva do Espírito Santo.
Agora eu sei indica um novo tipo
de conhecimento, um conhecimento que passa do meramente cognitivo para o tipo
pessoal e experimental.
Essa declaração de Vesta faz-me lembrar do ensino
apostólico acerca da consciência espiritual. Declarou Paulo aos crentes de Corinto:
Mas, como está escrito: Nem olhos viram, nem ouvidos
ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para
aqueles que o amam. Mas Deus no-lo revelou pelo Espírito; porque o Espírito a
todas as coisas perseruta, até mesmo as profundezas de Deus. Porque, qual dos
homens sabe as coisas do homem, senão o seu próprio espírito que nele está?
Assim também as coisas de Deus ninguém as conhece, senão o Espírito de Deus.
Ora, nós não temos recebido o espírito do mundo, e, sim, o Espírito que vem de
Deus, para que conheçamos o que por Deus nos foi dado gratuitamente. Disto
também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas
pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais. Ora, o homem
natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não
pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente (1 Co 2.9-14).
Essa passagem é tão importante para o nosso entendimento
sobre o Espírito Santo que retornaremos a ela mais adiante, para uma exposição
mais completa. Entretanto, notamos que Paulo falava aqui de uma espécie de
discernimento espiritual que não é "natural" para nós. Em outras
palavras, em nosso estado humano decaído nos falta a habilidade de acolher as
realidades de Deus. De fato, Paulo declarou enfaticamente: "não pode entendê-las ".
É impossível que uma pessoa não-espiritual tenha o
discernimento das realidades espirituais. Não somos, por natureza, pessoas
espirituais. Uma pessoa não pode discernir coisas espirituais enquanto não for
primeiramente vivificada, pelo Espírito de Deus, para as realidades
espirituais. É a obra de regeneração do Espírito, ou renascimento espiritual,
que nos capacita a ter discernimento espiritual.
Quando Vesta disse: Agora eu sei, ela estava consciente
— ou mesmo inconscientemente — dando testemunho de seu novo estado espiritual,
de sua conversão.
"Agora eu sei quem é o Espírito Santo."
É significativo que Vesta não tenha dito:
"Açora eu sei o que é o Espírito Santo ". Ela sabia quem ele era. Sua consciência inicial do Deus
Espírito Santo foi a consciência de uma presença pessoal.
A Bíblia revela o Espírito Santo não como uma força
abstrata, um poder ou uma coisa, mas como "ele". O Espírito Santo é
uma pessoa. Uma personalidade inclui inteligência, vontade e individualidade.
Uma pessoa age por intenção. Nenhuma força abstrata pode tencionar fazer qualquer coisa. Boas ou más intenções
são limitadas aos poderes dos seres pessoais.
A BÍBLIA USA
PRONOMES PESSOAIS PARA INDICAR O ESPÍRITO SANTO
Quando falamos sobre pessoas usamos pronomes
pessoais como eu, tu, ele e ela. Naturalmente, há ocasiões quando tais palavras
são usadas para indicar objetos impessoais ou coisas. Usamos termos no
masculino ou feminino para nos referir a coisas como embarcações, carros ou
igrejas. Normalmente isso é feito de maneiras claramente reconhecíveis. A
personificação também é um instrumento útil nas expressões poéticas.
Entretanto, quando as Escrituras usam pronomes
pessoais para indicar o Espírito Santo, elas o fazem em passagens que não são
poéticas, mas narrativas e didáticas. Lemos em Atos 13.2:
E, servindo eles ao Senhor, e jejuando, disse o
Espírito Santo: Separai-me agora a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho
chamado.
Observamos aqui o uso das palavras me e eu (oculto,
dentro da frase "a que (eu) os tenho chamado", atribuídas ao Espírito Santo. Também notamos de passagem que, nesse
texto, o Espírito Santo fala e dá instruções inteligíveis e intencionais. Observamos uma
ocorrência similar em João 15.26:
Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o
Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim.
Aqui Jesus, se refere ao Espírito Santo usando as palavras que e esse. Alguns estudiosos poderão
replicar que, neste texto, a palavra grega para Consolador não está no gênero masculino e que, de acordo com as regras da
gramática, o pronome deve concordar com o substantivo quanto ao gênero. Entretanto, há uma cláusula intercalada, ("o Espírito da verdade, que") que usa o gênero neutro para indicar o Espírito. Se o escritor
sagrado quisesse dar a entender que o Espírito deveria ser pensado como uma
força impessoal e neutra, não havia razão alguma para usar o pronome masculino
esse em conjunção tão próxima com um substantivo neutro.
Se essa questão não é muito clara no capítulo quinze do evangelho de João,
ela fica clara como cristal, em João 16.13:
Quando vier, porém, o Espírito da verdade, ele vos guiará a toda a verdade; porque não falará por si mesmo,
mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará as coisas que hão de vir.
Não há neste texto bíblico qualquer razão gramatical para se usar o
pronome masculino, ele, a menos que Jesus tencionasse declarar, nesta
passagem didática, que o Espírito Santo é
uma pessoa.
SOMOS CHAMADOS A UM
RELACIONAMENTO PESSOAL COM O ESPÍRITO SANTO
A Bíblia nos convida a crer no Espírito Santo. Somos batizados em seu nome, bem como no
do Pai e do Filho. O Espírito Santo é um objeto de oração. Os crentes não devem dirigir-se a "coisas" em
suas orações. Fazer isso seria idolatria. Devemos nos dirigir exclusivamente a
Deus, que é um ser pessoal.
A bênção apostólica, nas páginas do Novo Testamento, inclui referência à
comunhão e ao companheirismo com o Espírito Santo:
A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito
Santo sejam com todos vós (2 Co 13.14).
O Novo Testamento exorta-nos a não pecarmos contra o Espírito Santo, a não
resistirmos ao Espírito Santo e a não entristecermos o Espírito Santo. Ele nos
é apresentado como uma pessoa a quem podemos agradar ou ofender, que pode amar
e ser amado e com quem podemos ter comunhão pessoal.
O ESPÍRITO SANTO REALIZA TAREFAS
PESSOAIS
O Espírito Santo se relaciona conosco como uma pessoa. Ele faz coisas por nós e em nosso
favor, coisas essas que, normalmente, associamos a atividades pessoais. Ele nos ensina.
Ele nos consola. Ele nos guia. Ele nos encoraja.
Essas atividades podem ser realizadas,
ocasionalmente, por objetos impessoais. Os marinheiros podem ser
"guiados" pelas estrelas. Podemos ser consolados ao contemplar um
belo pôr-do-sol. Mas o consolo derivado de tal contemplação baseia-se na suposição, consciente ou inconsciente, de que, por detrás do pôr-do-sol
existe a pessoa do artista que o criou. Também podemos ser "ensinados"
quando observamos objetos naturais, mas tão somente por meio de analogias.
A maneira como o Espírito Santo consola, guia, ensina, etc, é uma maneira pessoal. Quando ele realiza essas
tarefas, a Bíblia as descreve como atividades do Espírito, que envolvem inteligência, vontade,
sentimentos e poder. O Espírito também perscruta, seleciona, revela e admoesta. As
estrelas e o pôr-do-sol não agem dessa maneira.
Em suma, concluímos que se o Espírito Santo pode ser amado, adorado,
obedecido, ofendido, entristecido, ou se podemos pecar contra ele, é porque ele
deve ser uma pessoa.
Mas permanece de pé a pergunta: O Espírito Santo é uma pessoa distinta?
Ele possui uma personalidade que pode ser distinguida da personalidade de Deus
Pai ou da personalidade de Deus Filho? Todas as qualidades pessoais que a
Bíblia atribui ao Espírito Santo realmente se referem à personalidade do Pai,
sendo o Espírito apenas um aspecto dele?
Essas perguntas de imediato levantam o problema de como devemos pensar
acerca de Deus. Nós cremos em um Deus ou em três Deuses? A difícil e misteriosa idéia da Trindade intromete-se em nossa maneira de pensar desde o instante em que
começamos a pensar no Espírito Santo como uma pessoa distinta. Faz parte da fé
clássica da Igreja que o Espírito Santo não somente é uma pessoa; ele é,
igualmente, uma pessoa divina; ele é Deus.
Fonte: O MINISTÉRIO DO ESPÍRITO SANTO, R. C. Sproul – Editora Cultura
Cristã
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